Instituto Pensar - Vínculo empregatício para entregadores da Loggi

Vínculo empregatício para entregadores da Loggi

A Justiça do Trabalho, em São Paulo, reconheceu em primeira instância a existência de vínculo empregatício entre a Loggi – um dos principais aplicativos de delivery do país – e os entregadores. Trata-se de uma decisão histórica, porque é a primeira decisão judicial em ação civil pública, ou seja, que verifica a questão do ponto de vista macro, e não individual. A decisão da 8ª Vara do Trabalho de São Paulo foi publicada no dia 6 de dezembro. O Ministério Público do Trabalho moveu a ação em agosto do ano passado. A empresa pode recorrer da decisão. 

As plataformas, em geral, afirmam apenas intermediar a relação entre consumidores finais e prestadores de serviço. Nesse sentido, os entregadores teriam flexibilidade e autonomia para decidir quando trabalhar e seriam profissionais autônomos. Porém, a decisão da Justiça do Trabalho entendeu que os requisitos de uma relação de emprego – habitualidade, onerosidade, pessoalidade e subordinação – estão presentes no contrato que a Loggi estabelece com os motoboys. 

De acordo com o MPT, há 15 mil entregadores com cadastro ativo no aplicativo. A sentença também determina que ela deixe de contratar os entregadores como autônomos, pague adicional de periculosidade e respeite o limite da jornada de trabalho a oito horas diárias, a partir do qual cabe hora extra. Além disso, a decisão afirma que apenas profissionais com motos regularizadas, e que atendam a exigências de segurança previstas em lei, devem ser admitidas pelo aplicativo. E ordena que a empresa registre os profissionais cadastrados em seu sistema que tiveram atividade nos últimos dois meses, dando prazo até março de 2020 para isso. 

A decisão também proibiu a Loggi de conceder prêmios e recompensas para incentivar os entregadores a trabalhar e obrigou a companhia a criar pontos de apoio aos motofretistas, com banheiros e ambiente para descanso. A empresa foi condenada ainda a pagar R$ 30 milhões de indenização por dano moral coletivo, para "efeito pedagógico”. De acordo com matéria da Bloomberg, de junho deste ano, a Loggi estava avaliada em 1 bilhão de dólares.

Na decisão, a Justiça do Trabalho determina que a Loggi limite a jornada dos motoristas a oito horas, implemente descanso semanal de 24 horas consecutivas e faça registro em sistema eletrônico de todos os motoristas que tiveram alguma atividade nos últimos dois meses. A empresa também terá de fazer o pagamento adicional de periculosidade aos motofretistas e precisará fornecer capacetes e coletes de segurança para os trabalhadores.

Em setembro, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu que os motoristas que trabalham para serviços de transportes por aplicativo, como Uber, não têm qualquer tipo de vínculo trabalhista com as empresas.

Em nota à imprensa, a Loggi lamentou a decisão da Justiça do Trabalho, reiterou que a decisão pode ser revista e afirmou que "continuará gerando renda” para entregadores, clientes e movimentando a economia. Disse que para "garantir a proteção social aos milhares de entregadores autônomos”, a empresa apenas cadastra quem seja Microempreendedor Individual (MEI), afirmando que é o "sistema criado pelo governo federal para formalizar os profissionais e assegurá-los aposentadoria e assistência social”

O algoritmo como chefe 

A ação baseou-se em uma investigação, também inédita. Após demanda do sindicato da categoria, a Superintendência Regional do Trabalho em São Paulo passou a investigar a relação entre a empresa e os entregadores em 2017. Logo no início da investigação houve uma greve contra a empresa, porque baixaram o preço da remuneração das entregas. Ficou a dúvida: como é que trabalhador autônomo faz greve? A equipe de auditores fiscais do trabalho se conectou à comunidade dos motoboys para entender como trabalhavam, o cotidiano e a organização do trabalho. Após quatro meses de fiscalização, a empresa foi autuada em dezembro de 2017. 

No momento em que o trabalhador se conectava ao aplicativo, ele ficava sob a vigilância e as regras da empresa. Ao levar em consideração que a empresa está trabalhando com uma nuvem de entregadores, ela sabe que há algum motoqueiro que vai aceitar a corrida. O indivíduo pode recusar chamadas e se logar no sistema no momento em que quiser, mas quando se loga e aceita, todo a sua vida é guiada pelo algoritmo. O resultado é que os entregadores é mais subordinado que outras categorias de trabalhadores e que o algoritmo é mais poderoso que o relógio de ponto.

A Loggi diz que "a transformação digital já está trazendo mudanças estruturais em todo mercado de trabalho e na economia, a partir de jornadas mais flexíveis e uso de tecnologias para encontrar oportunidades de renda”. 

O debate sobre a existência de vínculo empregatício entre trabalhadores e plataformas digitais não se restringe ao Brasil. Em setembro, o Estado da Califórnia – berço das principais startups do mundo – aprovou a AB5, lei que reconhece os trabalhadores de aplicativos como empregados formais. A iniciativa pode se estender a outros estados americanos, como Washington e Oregon.

Desde o ano passado, as plataformas de transporte já são obrigadas a garantir um salário mínimo aos motoristas na cidade de Nova York. Mas lá os trabalhadores ainda não têm o status de empregados.

Com informações do Blog do Sakamoto



0 Comentário:


Nome: Em:
Mensagem: