Instituto Pensar - EUA exige que funcionários do governo e suas famílias deixem Belarus

EUA exige que funcionários do governo e suas famílias deixem Belarus

por: Mariane Del Rei 


Embaixada dos Estados Unidos em Kiev, capital da Ucrânia. Foto: Efrem Lukatsky/AP

Os EUA determinaram na segunda-feira (31) que as famílias dos funcionários do governo estadunidense em Belarus deixem o país em meio a temores de uma possível invasão russa da vizinha Ucrânia.

O Departamento de Estado dos EUA "ordenou a saída de familiares de funcionários do governo dos EUA? de Belarus, de acordo com um comunicado divulgado na segunda-feira. 

Washington também alertou os cidadãos dos EUA para não viajarem para Belarus, citando "a aplicação arbitrária das leis, o risco de detenção e o acúmulo de militares russos ao longo da fronteira de Belarus com a Ucrânia?.

A ordem veio horas depois que Washington e Moscou entraram em confronto no Conselho de Segurança das Nações Unidas sobre a Ucrânia.

Tropas russas em Belarus

Os EUA acusaram a Rússia de planejar aumentar sua presença de soldados em Belarus para 30 mil nas próximas semanas, para se somarem aos 100 mil que deslocou para a área da fronteira ucraniana-russa. Segundo os EUA, cerca de 5 mil soldados russos já estão em Belarus.

"Vimos evidências de que a Rússia pretende expandir essa presença para mais de 30 mil soldados perto da fronteira de Belarus? com a Ucrânia no início de fevereiro, disse a embaixadora dos EUA na ONU, Linda Thomas-Greenfield, durante a sessão do Conselho de Segurança.

Ela também disse que as forças ficariam a menos de duas horas ao norte de Kiev, a capital ucraniana.

Washington chamou o envio de tropas russas à fronteira de "ameaça à paz e segurança internacionais? e ameaçou impor sanções a oligarcas russos ricos se a Ucrânia for atacada.

O embaixador da Rússia na ONU, Vassili Nebenza, revidou, dizendo que os EUA estão provocando "histeria? e chamou a cúpula da ONU de "golpe de relações públicas?.

Ele acrescentou que as tropas estão em Belarus para exercícios militares conjuntos. Enquanto isso, Belarus negou que esteja sendo usada como palco para uma invasão russa da Ucrânia.

As tensões entre a Rússia e o Ocidente sobre a Ucrânia têm aumentado, apesar das negociações diplomáticas em andamento.

Rússia responde à carta dos EUA

Na noite de segunda-feira, a Rússia enviou uma resposta por escrito às propostas de Washington para diminuir as tensões com a Ucrânia.

O Departamento de Estado dos EUA não revelou o conteúdo da carta. "Seria improdutivo negociar em público, então deixaremos para a Rússia se, caso queira, discutir sua resposta?, disse uma porta-voz do Departamento de Estado, acrescentando que Washington continuará a consultar seus aliados e parceiros, incluindo a Ucrânia.

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Na semana passada, o governo dos EUA enviou uma carta ao Kremlin respondendo às preocupações de Moscou sobre a segurança na Europa.

Moscou disse que não tem planos de invadir a Ucrânia, mas exigiu garantias da Otan de que nunca vai permitir a adesão de Kiev à aliança. As outras demandas incluem a retirada das forças da Otan da Europa Oriental e o fim da presença de armas perto das fronteiras da Rússia.

Tanto a Casa Branca quanto a Otan rejeitaram as exigências, embora o ministro do Exterior da Rússia, Serguei Lavrov, tenha dito que eles fizeram algumas propostas interessantes sobre o que chamou de questões "secundárias?.

Crise na Ucrânia é escalada da Otan contra Rússia

No programa 20 Minutos Análise, do Opera Mundi, de terça-feira (01), o jornalista Breno Altman discutiu o risco de uma guerra entre a Rússia e a Organização do Tratado do Atlântico Norte (Otan). O governo ucraniano, de direita e pró-ocidente, tem se posicionado a favor da aliança militar, promovendo também uma escalada de agressões contra a maioria russa do Donbass, ao oeste. A Rússia, então, que considera a filiação da Ucrânia à Otan como um grave risco à segurança nacional, concentrou tropas na fronteira.

As negociações diplomáticas continuam em curso, mas atravessam um impasse. O jornalista esclareceu que para entender como chegaram a esse ponto, é necessário voltar ao episódio da dissolução da União Soviética (URSS), em dezembro de 1991, quando tanto a Rússia quanto a Ucrânia formavam parte do primeiro Estado socialista do mundo, partilhando infraestruturas, incluindo instalações militares, principalmente aeronáutica, equipamento industrial e armamento nuclear ? herdados pela Ucrânia, que chegou a possuir o maior arsenal nuclear do mundo.

Logo após o fim da URSS, porém, a Ucrânia passou a viver, do ponto de vista político, o conflito entre dois blocos internos: um deles mais favorável à integração europeia e à aliança com o Ocidente, liderado pelos setores financeiro e do agronegócio da nova burguesia ucraniana, surgida da restauração capitalista; e outro mais inclinado à aproximação com a Rússia de Putin, cuja liderança era ocupada por frações da antiga tecnocracia civil e militar, além de frações burguesas mais tradicionais, protecionistas e vinculadas ao mercado interno.

Essas duas correntes foram se alternando no governo entre 1991 e 2014. Até 2018, a Ucrânia faria parte da Comunidade de Estados Independentes, que agrupa a maioria dos países ex-soviéticos. O país também chegou a assinar o Tratado de Redução Estratégica de Armas (START I), comprometendo-se a entregar todas as suas armas nucleares para a Rússia e se juntar ao Tratado de Não Proliferação de Armas Nucleares. Desde 1996, a Ucrânia não possui mais esse tipo de armamento e suas tropas foram reduzidas de 780 a 400 mil soldados. 

Essa política de desarmamento foi uma das exigências permanentes da Rússia para a salvaguarda de sua segurança, cuja lógica é impedir que os países vizinhos possam servir de trampolim a potenciais inimigos. 

Cerco militar

Em sua análise, Breno Altman afirmou que outra das exigências históricas da Rússia, desde os primeiros momentos pós-soviéticos, foi o compromisso da Otan se manter em suas fronteiras originais, sem se expandir para o leste europeu e sem promover uma corrida armamentista da Ucrânia e outras nações ex-soviéticas com a Rússia. 

James Baker, secretário de Estado durante o governo George Bush (1989-1993), assumiu com Mikhail Gorbatchev, então presidente da União Soviética, em 1989, logo após a queda do Muro de Berlim, que a Otan não avançaria nem uma só polegada em direção ao leste. 

Entretanto, alguns dos países antes pertencentes à URSS ingressaram na aliança militar, como é o caso da Estônia, Letônia, Lituânia, Polônia, República Tcheca, Romênia e Bulgária.

Esse cerco militar à Rússia foi se agravando com a ascensão e consolidação de Vladimir Putin. Mesmo se mantendo na política de restauração capitalista, o ex-prefeito de São Petersburgo chegou ao Kremlin disposto a romper com o modelo de subordinação ao Ocidente implementado por seu antecessor Boris Yeltsin.

Nos cálculos dos EUA e da Otan, a Rússia voltou a ser um inimigo, ainda mais com a aceleração do desenvolvimento chinês e a progressiva associação entre os dois Estados. 

Essa perspectiva estratégica, de isolar e enfraquecer a Rússia de Putin, ganhou novos contornos a partir exatamente da Ucrânia, em 2014. Ainda que a intervenção do Ocidente tenha sido permanente, desde os anos 90, buscando favorecer a corrente liberal, há oito anos essa interferência foi decisiva.

Crise política na Ucrânia

O governo de Viktor Yanukovych, presidente eleito em 2010, próximo à Rússia, se recusa a assinar, no final de 2013, um acordo de adesão à União Europeia. Os liberais, apoiados por grupos de extrema direita, alguns abertamente neonazistas, lançaram um movimento de protesto contra a decisão presidencial, logo denominado de Euromaiden. 

Frente aos protestos, cada vez mais fortes e violentos, Yanukovyvh acaba sendo deposto pelo Parlamento, que convoca eleições antecipadas e sai vencedor o candidato Petro Poroshenko, um empresário bilionário ultradireitista, pró-União Europeia. Antes mesmo das eleições, a Rússia anexou a região portuária da Crimeia, em março, que havia sido cedida à Ucrânia em 1954. Essa anexação foi formalizada através de um referendo popular, contestado pelo Ocidente. 

A resposta do bloco derrubado pelo golpe parlamentar contra Yanukovytch também foi contundente: levantes ocorreram em regiões de maioria russa e com maior influência do Partido Comunista Ucraniano, impulsionando o surgimento da República Popular de Donetsk e a República Popular de Lugansk, situadas no Donbass, imediatamente atacadas pelas forças militares ucranianas, desatando um cenário de guerra civil, na qual a resistência contra o novo governo ucraniano teve apoio militar russo.  

Após três mil mortos, um cessar-fogo foi assinado em setembro de 2014. Desde então, uma série de conversações e acordos teve lugar, até 2021, para colocar um fim ao conflito e convocar referendos que decidam o destino dessas repúblicas rebeldes, depois de adotadas medidas de desarmamento. 

Ressurgimento das tensões

Em fevereiro de 2021, porém, o governo ucraniano iniciou uma política de agressões e compra de armamentos contra os separatistas, abastecido por países da Otan. A Rússia respondeu mandando tropas para a fronteira.

Agora em janeiro, novas negociações foram abertas, em Genebra. A proposta russa foi clara: cumprir a palavra de Baker, sustar o avanço da aliança militar, estabelecer compromisso de não-incorporação da Ucrânia à organização, acabar com o fornecimento de armas ao vizinho e cumprir os acordos de Minsk. 

A Casa Branca recusou a oferta, apenas aceitando apoiar a retomada dos pactos que poderiam acabar com os conflitos no Donbass. A réplica de Moscou foi aumentar a mobilização na borda ucraniana e aventar a hipótese de criar infraestrutura militar em Cuba e na Venezuela.

Trata-se do episódio militar mais perigoso desde o final da Guerra Fria, talvez mesmo desde a crise dos mísseis de 1962, pois opõem diretamente duas potências nucleares. 

Para os EUA, parece ser estratégico enfraquecer e submeter a Rússia de Putin, dentro de sua estratégia de contenção da China e seus aliados, ao mesmo tempo em que busca reforçar sua hegemonia político-militar na Europa ? apesar do desconforto alemão com essa escalada e da aberta dissensão de outros países, como a Croácia, que ameaçam se desligar da Otan no caso de um enfrentamento aberto com a Rússia. 

Para a Rússia, está em jogo sua segurança, sua liderança sobre os países ex-soviéticos e sua recuperação como potência soberana.

Com informações do Opera Mundi




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