Investigações com base na LSN incomodam Polícia Federal
Acusada de ser usada para investigar críticos ao governo Bolsonaro, a Polícia Federal adotou uma nova conduta sobre a abertura de inquéritos com base na Lei de Segurança Nacional (LSN). Após conversas da cúpula da PF com o ministro da Justiça, Anderson Torres, chegou-se ao consenso de que investigações abertas com base nessa lei, que foi editada na ditadura militar e era usada para enquadrar e perseguir opositores, deveriam ser evitadas.
A avaliação de policiais em conjunto com a pasta da Justiça é que esse tipo de investigação alimenta teses de uso político da PF, o que é rechaçado pela corporação e pelo Ministério da Justiça. As informações são da jornalista Bela Megale, do jornal O Globo.
Em quase quatro meses de gestão, Anderson Torres não determinou a abertura de nenhum inquérito com base na LSN. A postura dele sobre o tema causou surpresa, já que a expectativa era de que o ministro, por ser aliado de primeira ordem do presidente Bolsonaro, seguisse na toada de seus antecessores. Tanto André Mendonça quanto Sergio Moro fizeram à PF requerimentos de investigações com base na LSN quando estavam no posto para investigar críticos a Bolsonaro.
Depois que Torres assumiu a pasta, no fim de março, a PF levou para o ministro, que também é delegado da corporação, incômodo que as investigações abertas com base na LSN despertaram no órgão.
A coluna apurou que os inquéritos abertos nos últimos meses com base nessa lei foram pedidos pela Ministério Público Federal ou pela Justiça. Também houve uma investigação aberta na delegacia da PF de Chapecó (SC) para apurar ameaças a Bolsonaro quando ele esteve na cidade para uma motociata. A LSN teve sua revogação aprovada pela Câmara e aguarda análise do Senado.
Mudança empacou no Senado
Após a Câmara decidir pela revogação da LSN, a medida ainda segue em vigor. O projeto que altera a legislação elaborada no período do regime militar empacou no Senado e nem sequer definiu um relator para analisar a proposta. A LSN está para ser analisada no Senado desde maio.
O governo é contra a redação aprovada pelos deputados e atua para barrar o projeto. Enquanto isso, a regra segue sendo usada para inibir críticos do presidente Jair Bolsonaro (sem partido). Desde a aprovação pelos deputados, no dia 4 de maio, o Senado já realizou dez sessões e votou outros 38 projetos.
PSB reivindica mudança em artigos da LSN
Além de governistas, partidos de oposição também defendem mudanças na proposta aprovada na Câmara. Parlamentares de siglas de esquerda veem uma brecha que permitiria criminalizar a atuação de movimentos sociais.
Leia também: Câmara acelera projeto que substitui Lei de Segurança Nacional
Em março deste ano, um grupo de sete juristas convocados pelo Partido Socialista Brasileiro (PSB) encaminhou ao ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal (STF), uma análise sobre dois dispositivos da Lei de Segurança Nacional que são questionados em ação apresentada à Corte pelo próprio partido. A ação ainda não foi julgada e não há previsão para o julgamento.
O PSB solicitou que o STF determine ao Congresso, em caráter liminar, que edite lei de defesa do Estado Democrático de Direito em prazo a ser fixado, sob pena de suspensão da eficácia da Lei de Segurança Nacional. Para os socialistas, 11 dispositivos ofendem preceitos fundamentais, como a liberdade de expressão, o direito à informação e o princípio republicano. Outra norma contraria garantias processuais, como o princípio do juiz natural.
O PSB não pediu a impugnação de toda a lei, pois entende ser essencial a manutenção de mecanismos para o Judiciário combater ataques à democracia e às instituições, sobretudo nos tempos em que extremistas e negacionistas promovem atos e mobilizações em favor de medidas de ruptura democrática.
Motivos do Senado para ?frear? revogação da LSN
Entre os motivos apontados por senadores para o freio está a necessidade de se ampliar o debate sobre a mudança. Ao revogar a LSN, a Câmara criou no lugar a chamada "Lei do Estado Democrático?, que tem como pressuposto, entre outros pontos, instituir o crime de golpe de Estado, inexistente na legislação atual nestes termos.
O texto, porém, sofre resistência de governistas, que tentam barrar a previsão de prisão de até cinco anos para quem fizer disparos de fake news em massa durante o período eleitoral.
Aliados do presidente também são contrários a retirar da lei a punição para quem caluniar ou difamar o presidente da República, sob o argumento de que seria uma "carta branca? para Bolsonaro ser chamado de "genocida?. Apesar da pressão governista, o trecho foi revogado pela Câmara.
"O texto aprovado na Câmara vai ter que ser analisado com calma, pois há temas delicados como a inclusão de 14 novos crimes, os chamados ?crimes contra o Estado Democrático de Direito??, afirmou o vice-líder do governo, senador Marcos Rogério (DEM-RR), que cita entre os "novos crimes? o compartilhamento de mensagens em massa nas eleições.
Ele se diz favorável à revogação da LSN, que chama de "entulho autoritário?, mas pede cautela com o que vai ser aprovado no lugar. "Teve uma nova Constituição em 1988 e a LSN tinha que ser interpretada à luz dela?, disse.
Intimidação
A ofensiva jurídica de Bolsonaro contra críticos ao governo tem sofrido seguidos reveses na Justiça e no Ministério Público. Ao menos dez pedidos de investigações, quatro delas baseadas na LSN, foram suspensas nos últimos meses. Para especialistas, apesar de derrotadas nos tribunais, as ações servem como uma forma de intimidação a oposicionistas.
O número de procedimentos abertos com base na lei pela Polícia Federal para apurar supostos delitos contra a segurança nacional aumentou 285% nos dois primeiros anos do governo Bolsonaro, na comparação com o mesmo período das gestões Dilma Rousseff e Michel Temer.
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