Instituto Pensar - Governo deixa de gastar R$ 80,7 bi da verba de combate à pandemia

Governo deixa de gastar R$ 80,7 bi da verba de combate à pandemia

por: Lucas Nanini 


Um estudo do Instituto de Estudos Socioeconômicos (Inesc) publicado nesta quarta-feira (7) aponta que o governo federal deixou de gastar R$ 80,7 bilhões destinados para o enfrentamento da pandemia da Covid-19 em 2020. Esse valor equivale a 15% dos R$ 604 milhões reservados para este fim.

Leia também: Covid-19: Brasil ultrapassa 4 mil mortes diárias e proposta de ?apartheid sanitário? avança

Do valor previsto que não foi gasto, R$ 28, 9 bilhões eram destinados ao pagamento de auxílio emergencial ? o equivalente a 35,8% do que sobrou. De acordo com o levantamento, os gastos sem planejamento por parte do governo não evitaram mortes e tornaram o quadro para 2021 ainda mais crítico, tendo impacto no total de desempregados do país ? 13,4 milhões de pessoas.

"Na situação de emergência e calamidade que o Brasil se encontrava em 2020, o governo tinha a obrigação de gastar o máximo de recursos disponíveis para proteger a população. Mas o que vimos foi sabotagem, ineficiência e morosidade no financiamento de políticas públicas essenciais para sobreviver à crise?, afirmou a assessora política do Inesc, Livi Gerbase ao El País.

"No caso do auxílio emergencial, não só o valor caiu para a metade, de uma média de 600 para em torno de 300 reais por mês por pessoa no segundo semestre, como também excluíram muita gente do benefício. A princípio, com esses R$ 29 bilhões que estavam lá para isso e não foram utilizados dava para ter excluído menos gente, por exemplo.?
Livi Gerbase, assessora política do Inesc

Gastos do governo foram analisados

O estudo do Inesc, que recebeu o nome de "Um país sufocado ? Balanço do Orçamento Geral da União 2020?, analisa os gastos do governo no ano passado. Os dados avaliados incluem as despesas extraordinárias para minimizar a crise pela pandemia da Covid-19, os gastos com políticas públicas das áreas de Saúde, Educação, Meio Ambiente e Direito à Cidade e também o emprego de recursos para políticas que atendem grupos intensamente afetados pela crise, como mulheres, indígenas, quilombolas, crianças e adolescentes.

Menos investimento na Educação

Os gastos do governo federal com Educação em 2020 diminuíram consideravelmente em várias frentes, em 2020. Segundo a assessora do Idesc, esse "abandono? vai cobrar um preço enorme para a economia no futuro.

"Não houve uma política estruturada de desenvolvimento de material didático, compra de pacotes de dados e equipamentos para professores e alunos conseguirem trabalhar remotamente, nada estruturado em âmbito nacional que apoiasse a educação nesse momento tão duro.?

Na educação infantil, por exemplo, foram investidos R$ 145 milhões, valor equivalente a pouco mais de um terço dos R$ 410 milhões de 2019. Os gastos com políticas voltadas para crianças, adolescentes e jovens também caíram significativamente ou até mesmo desapareceram. No total, esse segmento teve queda de 9,4% em relação a 2019.

Investimentos em pesquisa também tiveram redução em 2020. Os gastos da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes) caíram de R$ 4,6 bilhões para R$ 3,5 bilhões ? 24% menos.

Recentemente, centenas de nomes ligados à elite econômica do país, entre empresários, economistas e banqueiros, enviaram uma carta aberta ao governo federal cobrando mais eficiência no combate à crise decorrente da pandemia, alertando que não há falta de recursos, mas sim de medidas de gestão. O grupo também chamou a atenção para o fato de que é preciso uma ação imediata, especialmente pelo país ter 40% da força de trabalho ganhando a vida de modo informal e sem proteção contra o desemprego.

O comunicado também mencionou a necessidade de retomada de medidas de apoio às pequenas e médias empresas. Outra proposta do grupo é uma reforma no sistema de proteção social, "visando aprimorar a atual rede de assistência social e prover seguro aos informais?.

Falta de combate à desigualdade racial

Apontado como um dos principais fatores no processo de exclusão social no Brasil, a desigualdade racial foi outro segmento esquecido pelo governo federal, com a extinção de projetos e menor uso de recursos, apontou o estudo do Inesc. O Programa 2034: Promoção da Igualdade Racial e Superação do Racismo, por exemplo, não recebeu nenhum valor em 2020. Em 2019, o investimento havia sido de R$ 10,3 milhões. O Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos (MMFDH) encerrou o ano deixando de utilizar 70% da verba autorizada, tendo usado R$ 35,4 milhões dos R$ 120,4 milhões previstos.

Recessão maior à vista

Com base nos resultados do estudo, a previsão do Inesc é de que a recessão aumente. O orçamento aprovado no Congresso Nacional, ainda não assinado pelo presidente da República, não será suficiente para sanar a situação, uma vez que não prevê que algumas áreas tenham o gasto mínimo de acordo com a lei.

Para o Inesc, é preciso revogar de forma emergencial o teto de gastos, estabelecer um piso mínimo de R$ 168,7 bilhões para a Saúde e adotar novamente o auxílio emergencial de R$ 600. Outras medidas necessárias são a decretação de novo Estado de Calamidade e a elaboração de um novo "orçamento de guerra? para despesas referentes à pandemia, diz a assessoria do instituto.

O consultor econômico, Fábio Klein, da empresa Tendências Consultoria, disse ao El País que parte dos R$ 80 bilhões do "orçamento de guerra? que não foram gastos pelo governo ficaram como "restos a pagar? para 2021. A manobra consiste em deixar para o ano seguinte o pagamento de gastos contratados. Segundo Klein, esse valor entraria na conta do teto de gastos deste ano e não poderia ser utilizado no caso dos gastos excepcionais da pandemia, mas o Tribunal de Contas da União autorizou o uso da verba no enfrentamento da Covid-19.

"Destes R$ 80 bilhões, cerca de R$ 25 bilhões serão gastos ainda este ano em vacinas. Foi uma discussão muito grande isso, e se começar a ser feito de maneira descontrolada pode acabar em pedalada fiscal?, disse o consultor.

"O Brasil começa a pandemia muito endividado, gastou uma quantidade enorme de dinheiro sem muito planejamento e hoje o que vemos é que somos os um dos piores do mundo, mesmo dentre emergentes, no controle dos efeitos da pandemia tanto na saúde da população quanto na economia.?
Fábio Klein, consultor econômico

Para o economista, os países com melhores resultados no combate à pandemia fizeram massivas campanhas de vacinação e adotaram "lockdown? a partir do final do ano passado, no que se chamou de "segunda onda do coronavírus?. O Brasil não tomou nenhuma das duas medidas.

"O resultado está, enquanto vários locais começam a reabrir sua economia e retomar a vida normal, nós estamos nessa escalada sem controle?, afirmou Klein. "Outro erro foi de uma hora para outra retirar todos os programas de apoio econômico, como auxílio emergencial e às empresas, como se desse para acabar com a pandemia por decreto. Foram programas fundamentais no ano passado, inclusive capazes de reduzir a pobreza e desigualdade históricas, que deixaram de existir sem que fossem criadas condições para isso.?

Com informações do El País



0 Comentário:


Nome: Em:
Mensagem: