Afetos e memórias das roupas é tema de nova série da Netflix
por: Iara Vidal
O mês de abril é dedicado à Revolução da Moda pelo Fashion Revolution, um movimento global que atua para uma indústria da moda mais limpa, justa e transparente.
O Socialismo Criativo preparou uma série de matérias sobre a indústria da moda como uma expressão da economia criativa. Os textos são de Iara Vidal, representante do Fashion Revolution em Brasília e jornalista do portal, e serão publicados ao longo do mês de abril.
Siga a hashtag #FashionRevolution2021 e acompanhe os textos sobre o movimento.
Histórias sobre relações com as roupas
Um dos aspectos das roupas que vestimos vai além do valor funcional e estético. Em muitos casos, as peças guardam memórias afetivas ou ajudam a consolidar a nossa identidade. Essas conexões emocionais da moda são o ponto de partida da nova série documental da Netflix, "Histórias para Vestir?.
A série é baseada nos livros best-sellers de Emily Spivack, "Worn Stories? (2014) e "Worn in New York?(2017, que narram histórias de pessoas comuns e famosas, como a artista Marina Abramovi? e a diretora Greta Gerwig, e seus respectivos guarda-roupas.
Lançada na última quinta-feira (1o), a produção abre o armário de um variado ? e curioso ? grupo de pessoas e desvenda as histórias e significados de algumas peças do guarda-roupas. Com oito episódios de aproximadamente 30 minutos, o espectador acompanha as narrativas divertidas e comoventes sobre roupas.
Além da estética e da funcionalidade
Para a designer, professora e representante do movimento Fashion Revolution em Curitiba (PR), Aline Bussi, as roupas têm significados que vão além da estética e funcionalidade.
"A roupa carrega história desde o momento que é produzida. A quantidade de pessoas envolvidas nos processos produtivos da moda, envolve a vida de muitas pessoas, principalmente; a vida de muitas mulheres que são a força criativa, e produtiva do setor no país.?
Aline Bussi
Para Aline, ao nos vestirmos, escolhemos o nosso "figurino da vida? que expressa como nos sentimos e como seremos percebidos. A roupa passa a ser suporte das nossas sensações vividas e memórias que fazem com ela oferte mais que a estética e funcionalidade. "Experimente olhar um álbum de família, e perceba quantas histórias vão surgir a partir das roupas ali registradas. Roupa é memória e deve ser preservada como tal?, convida.
Significados variam para cada pessoa
A jornalista especializada em moda e estilo de vida e representante do Fashion Revolution Brasil em Santos (SP), Suzana Elias Azar, também acha que as roupas têm significados além da estética e da funcionalidade e esses significados variam de pessoa para pessoa.
Suzana comenta que a relação dela com as roupas passa bastante pelo emocional e pelas histórias por trás de cada uma delas. Ela recorda que quando tinha 15 anos de idade perdeu a avó paterna, de quem era afilhada e apaixonada.
"Na hora de separar as coisas dela eu quis uma blusa de crochê que eu amava (tenho até hoje, e já estou com 50 anos), minha tia paterna questionou o que eu ia fazer com uma roupa de velha e eu respondi: crochê não é de velho, é lindo, eu gosto e vou usar a blusa do meu jeito. E usei muito, até hoje ainda uso.?
Suzana Azar
A jornalista relembra que a avó materna era extremamente elegante e gostava de moda, costurava para ela mesma, para filhas e netas e também fazia chapéus.
"Quando ela morreu em 2000, eu fiz uma lista de roupas dela que eu fazia questão que ficasse comigo e uso todas até hoje. Algumas peças sempre que eu uso alguém comenta: que linda! E ficam bobos quando respondo que veio direto do baú da minha vó.?
Suzana Azar
Tristeza, alegria e sorte
Suzana também já associou uma lembrança triste a uma peça de roupa. Ao receber a notícia da morte de um parente próximo, usava um macacão preto. Acabou por doar a peça por não desassociá-la da má recordação. Por outro lado, tem roupas que usa quando precisa de sorte e outras que a enchem de alegria.
"Muitas vezes me empolgo tanto com a peça que escolho vestir para tal situação que qualquer comentário sobre minha roupa faço questão de contar a história marcante daquela peça e porque escolhi para a ocasião. Roupas contam histórias e transmitem quem somos naquele momento.?
Suzana Azar
Experiências pessoas com roupas
Em oito episódios, a série retrata a vida das pessoas e as roupas que as vestem: desde o uniforme de um supervisor, passando pela 1ª camisa comprada por um homem após 41 anos na prisão até a camiseta da universidade usada por um astronauta antes de cada decolagem ? tudo é recheado de lembranças.
A partir de entrevistas, imagens de arquivo e sequências de animações, a escritora Emily Spivack se uniu à Jenji Kohan para dar continuidade aos dois livros da autora, "Worn Stories? e "Worn in New York?, por meio de um projeto que é novo para as duas. Enquanto Emily se joga no audiovisual, Jenji, criadora de séries premiadas como "Orange is the New Black?, encabeça sua primeira produção sem script.
Apaixonada por roupas vintage, Emily começou a se interessar pela história por trás das roupas enquanto comprava um par de sapatos pelo eBay, em 2007, e encontrou no site uma fantasia de Coelhinha da Playboy acompanhada por uma foto preto e branca de sua antiga dona.
Em entrevista ao WWD, Emily contou que foi naquele momento em que se questionou quem seria aquela mulher e o interesse por essas histórias teve início. A escritora começou a fazer uma espécie de curadoria de histórias pelo eBay, em que pessoas comentavam porque estavam vendendo uma peça, quem a havia usado e outras informações. Essa pesquisa deu início a um projeto chamado "Sentimental Value?, em que ela unia as histórias às roupas e as expôs em uma galeria.
A produção
Foi Jenji quem se interessou em transformar os livros de Emily em uma produção audiovisual, conectando suas habilidades de perceber que roupas tem história como qualquer outro objeto em nossas vidas.
Havia a preocupação de representar o maior número possível de trajetórias tanto nos livros quanto na série, para que todos os espectadores tivessem algo com o que se relacionar. Cerca de metade das histórias do documentário vieram de seus livros, enquanto outras são inéditas.
"Queria que representasse quem somos e nossa experiência humana coletiva contada pelas nossas roupas.?
Emily Spivack
A produção começa com um casal que vive em uma comunidade em que o uso de roupas é opcional ? e eles optaram por não usar. "O que adoro [nesse episódio] é que ele prepara o terreno para começar a pensar sobre o que dizemos por meio das roupas que vestimos e também por meio das roupas que decidimos deliberadamente não usar. O que estamos comunicando por meio das coisas que decidimos não usar??, questiona Emily.
A produção chega à plataforma de streaming em um momento em que o relacionamento das pessoas com as roupas mudou drasticamente por causa da pandemia. E Emily sonha que essa mudança ? principalmente seu lado afetivo ? seja permanente.
Com informações da Lilian Pacce e Harpers Bazzar
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