Instituto Pensar - Direitos da Natureza e o debate sobre a moda

Direitos da Natureza e o debate sobre a moda

por: Iara Vidal 


Foto: Alex Bamford

O mês de abril é dedicado à Revolução da Moda pelo Fashion Revolution, um movimento global que atua para uma indústria da moda mais limpa, justa e transparente.

O Socialismo Criativo preparou uma série de matérias sobre a indústria da moda como uma expressão da economia criativa. Os textos são de Iara Vidal, representante do Fashion Revolution em Brasília e jornalista do portal, e serão publicados ao longo do mês de abril.

Siga a hashtag #FashionRevolution2021 e acompanhe os textos sobre o movimento.

Direitos da Natureza é tema em 2021

Nesta edição de 2021, com todas as atividades em ambiente digital por conta da pandemia da Covid-19, o Fashion Revolution terá como um dos eixos temáticos "Direitos humanos e direitos da natureza?. Os outros dois grandes temas deste ano serão "Relacionamentos individuais, coletivos e com a natureza? e "Revolução Sistêmica?.

No Brasil, a moda encontra várias vezes com os Direitos da Natureza, ou a violação destes. O país, por exemplo, é um dos maiores produtores mundiais de couro bovino, e a criação de gado é responsável por cerca de 80% do desmatamento no território brasileiro segundo dados da Global Fashion Agenda. Mas o que é, afinal, Direitos da Natureza?

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Tema ainda não está disseminado no Brasil

Os Direitos da Natureza constituem o equilíbrio do que é bom para os seres humanos com o que é bom para as outras espécies do planeta. O conceito, juridicamente, ainda não está disseminado na jurisprudência das cortes brasileiras, mas já foi aplicado em processo do Ministério Público Federal (MPF).

Em agosto de 2011, o MPF no Pará impetrou uma ação civil pública contra a hidrelétrica de Belo Monte. O processo versou sobre os impactos irreversíveis da usina sobre o ecossistema da Volta Grande do Xingu; a morte iminente do ecossistema; risco de remoção dos índios Arara e Juruna e demais moradores da Volta Grande; vedação constitucional de remoção; e ? aí destaca-se o novo elemento ? a violação do direito das futuras gerações; o direito da natureza; e a Volta Grande do Xingu como sujeito de direito.

Exemplo do Equador

O único país que tem uma sólida definição na Constituição sobre Direitos da Natureza é o Equador. Na Carta Magna equatoriana de 2008, os Direitos da Natureza têm quatro artigos ? do 71 ao 74 ? que os definem e garantem.

O artigo 72 da Constituição do Equador diz: "O Estado aplicará medidas de precaução e restrição para as atividades que possam conduzir à extinção de espécies, a destruição de ecossistemas ou a alteração permanente dos ciclos naturais?. Já o artigo 74 afirma que "as pessoas, comunidades, povos e nações terão o direito a beneficiar-se do ambiente e das riquezas naturais que lhes permitam o bem viver?.

Foi a Justiça do Equador, inclusive, que julgou, em agosto de 2020, o 1° caso mundial sobre Direitos da Natureza. O escritório de advocacia britânico 20 Essex Chambers apresentou à Corte Constitucional equatoriana uma ação para impedir a extinção do urso-de-óculos (Tremarctos ornatus), última espécie remanescente de urso nativo da América do Sul.

A ação abordou os Direitos da Natureza, presentes na Constituição daquele país. O processo para salvar a espécie de urso foi o primeiro caso a evocar esses direitos não apenas no país, mas em todo o mundo. A concessão de autorização para mineração em larga escala na floresta de Los Cedros, onde vive o animal, motivou a ação.

Ailton Krenak é porta-voz dos Direitos da Natureza

O escritor e ativista do movimento socioambiental e de defesa dos povos indígenas líder indígena Ailton Krenak falou sobre o assunto durante a abertura do 9º Congresso de Extensão Universitária. O evento foi promovido pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) e pela Universidade Federal de Alfenas (Unifal) no dia 8 de março pela internet. O indígena destacou a relação de partilha que indígenas, quilombolas e ribeirinhos estabelecem com os ambientes onde vivem.

Em sua fala, Krenak destacou que os direitos humanos podem ser divididos em duas vertentes principais: o direito à vida e o direito ao pertencimento, que, segundo ele, se refere ao fato de que todo cidadão tem o direito de pertencer a uma comunidade.

"Pertencer a uma comunidade é algo que está diretamente relacionado ao direito à terra porque toda pessoa deveria poder se filiar à terra, se constituindo como defensora da vida na terra e agindo em defesa do planeta. Assim, os direitos humanos e o direito à vida constituem uma mesma dinâmica, em que as ideias de cidadania e de florestania andam juntas. Não podemos esquecer que não existem direitos humanos sem o direito à terra.?
Ailton Krenak 

Mutirão de pertencimento à terra

Krenak destacou que algumas comunidades que habitam o planeta, como os quilombolas, os ribeirinhos e os indígenas, já entenderam a importância de compartilhar a vida e a terra, "numa espécie de mutirão de pertencimento à terra. Esses povos já entenderam que a terra é nossa mãe, então não devemos enxergá-la como propriedade?.

Ao chamar a terra de "mãe?, o indígena explicou que esse tratamento transcende a dimensão poética. "A terra pode ser chamada assim porque ela faz exatamente o que uma mãe faria: ela provê. A terra é provedora dos homens.? Tal pensamento foi reafirmado diversas vezes pelo ativista.

"[?] a terra, como nossa mãe, precisa ser levada em conta. Se ela é deixada de lado, não existem direitos humanos. O homem moderno quer habitar a terra, mas sem se sentir parte integrante dela. Isso não é possível?.
Ailton Krenak

Ailton Krenak também criticou a ação humana que mira o lucro e destrói o meio ambiente. Segundo o escritor, o agronegócio, as grandes empresas, o mercado e o desenvolvimento devem existir sem que as pessoas percam o direito à terra, à vida e ao pertencimento.

"Estamos cada vez mais dependentes da tecnologia e pouco sensíveis à nossa mãe-terra. Sem a natureza, seremos subjugados e deixaremos de ser cidadãos. Estamos revirando o planeta, e ele está respondendo. O corpo ferido da terra vai acabar se recuperando, mas aí talvez será tarde demais.?
Ailton Krenak

Com informações do Repórter Brasil, Ciclo Vivo e UFMG



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