Lula e a Revolução
por: Domingos Leonelli
Por Domingos Leonelli*
Com alguns meses de atraso o ex-presidente Lula fez, em 7 de setembro, o discurso que todos nós esperávamos dele ao sair da prisão. Na oportunidade ele recitou uma fala ressentida, talvez justificada para uma pessoa comum que se sentisse injustiçada por uma prisão, fruto de um julgamento do qual ele não considera justo. E pelo fato de ter esperado solidariedade de antigos aliados, enquanto esteve preso por mais de 15 meses em Curitiba.
O Lula-pessoa sobrepujou o Lula-personagem da história recente do Brasil. Logo após ter demonstrando um certo desprezo pelos aliados à esquerda e ao centro, declarou que o PT não apoiaria outras candidaturas e que teria candidato próprio em todas as capitais brasileiras no pleito deste ano.
Novamente errou falando para dentro do seu partido e olhando para o próprio umbigo. Lamentavelmente, o PT o obedeceu.
O discurso de Lula no Dia da Independência teve a grandeza de um pronunciamento de estadista. Analisou os problemas brasileiros, referiu-se com propriedade à nova realidade decorrente do governo de Bolsonaro, propôs soluções a partir de sua própria visão e do seu partido.
Fez afirmações conceituais avançadas como a que "o que sustenta o capitalismo não é capital, mas somos nós, os trabalhadores? traduzindo brilhantemente em linguagem popular um dos mais caros axiomas marxistas.
Utilizou-se, inclusive, de uma palavra poucas vezes referida por ele ? o fez no discurso no dia de sua prisão na porta do Sindicato dos Metalúrgicos ? que é a palavra "revolução?.
Segundo ele, "ao tirar 40 milhões de brasileiros da miséria, nós fizemos uma revolução neste país?. É verdade que essa palavra é usada frequentemente para se referir a avanços positivos em qualquer área ? revolução na educação, revolução na saúde. A meu ver, não deveria ser utilizada por alguém com a responsabilidade histórica de Lula num discurso tão importante.
Primeiro porque essas pessoas não foram tiradas definitivamente da miséria por reformas estruturantes e revolucionárias. A medida mais profunda do governo Lula que se pode considerar estruturante foi o aumento do salário mínimo, que era menos de 90 dólares no governo de FHC para mais de 300 dólares com Lula.
Alem disso, os governos de Lula, dos quais nós de quase toda esquerda participamos, realizou programas sociais, educacionais e habitacionais de muito valor, mas que não alteraram a estrutura do capitalismo brasileiro.
Não fizemos a reforma tributária e preservamos todo arcabouço do sistema financeiro. Não fizemos a reforma politica, pelo contrário, nos utilizamos de um modelo patrimonialista, fisiológico e não raro corrupto, não fizemos a reforma agrária. E, principalmente, não alteramos em nada o modelo de desenvolvimento baseado numa industria tecnologicamente atrasada e na exportação de commodities.
Nesse sentido, apenas continuamos o governo de FHC, em que o Brasil entrou na era da economia do conhecimento como mero consumidor de produtos tecnologicamente avançados.
Acho que faltou ao bom discurso de Lula no 7 de setembro essa referência auto-critica sem a qual não recuperaremos "O Sentido Perdido da Revolução ? título do meu livro mais recente.
*Domingos Leonelli é ex-deputado federal, atualmente presidente do Instituto Pensar e coordenador do portal Socialismo Criativo.
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