Instituto Pensar - Cientistas pedem revisão do acordo Mercosul-União Europeia

Cientistas pedem revisão do acordo Mercosul-União Europeia

por: Nathalia Bignon 


(Foto: Divulgação)

Um estudo realizado por um grupo de 22 cientistas de diversas instituições europeias e americanas pedem um novo texto de acordo de livre-comércio com o Mercosul. O grupo, do qual fazem parte biólogos, geógrafos, ecólogos, juristas e economistas, afirma que a proposta apresentada é incompatível com as diretrizes ambientais da União Europeia (UE). O documento foi divulgado na quarta-feira (9).

Para eles, os principais problemas residem no fato de que o acordo não prevê sanções em caso de descumprimento de metas ambientais, não exige transparência, não traz mecanismos de rastreabilidade dos produtos e não é inclusivo ? ou seja, ouviu apenas os participantes da cadeia produtiva exportadora, mas não os povos que serão diretamente impactados por ela.

"Da forma como está, o tratado é inviável. Um novo acordo precisa ser feito, a partir de um grupo multissetorial, incluindo os povos indígenas tradicionais, as populações locais e sendo prevista a criação de um mecanismo de apelação e queixa?, disse um dos autores do artigo, o pesquisador Tiago Reis, que estuda ações de combate ao desmatamento na Universidade Católica de Louvain, na Bélgica.

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O artigo, endereçado a políticos europeus, destaca, sobretudo, que há incompatibilidades entre o tratado de livre-comércio e o Acordo Verde Europeu, divulgado pela presidência da Comissão Europeia em 11 de dezembro do ano passado.

Investimentos de ? 100 bilhões

O Acordo Verde prevê investimentos de ? 100 bilhões e um desenvolvimento sustentável da União Europeia. Isso também inclui o comércio: só deverão ser firmados tratados com nações que também perseguem as metas do Acordo do Clima de Paris ? do qual Jair Bolsonaro (sem partido) ameaçou se retirar.

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Ele lembra ainda a falta da determinação, no acordo, de mecanismos de sanção em caso de descumprimento de metas ambientais, como o Acordo de Paris, assinado em 2015. "O texto deveria mencionar claramente que em caso de descumprimento [de tratados assim] a União Europeia poderá bloquear o comércio?, defende ele.

"O comércio internacional é a espinha dorsal da economia mundial. Mas em vez de ser maligno, precisa ser alavancado para alcançar sustentabilidade?, comenta o geógrafo Simon Bager, também pesquisador da Universidade de Louvain. "Por isso, nosso artigo aponta os princípios centrais para acordos comerciais sustentáveis e tenta convencer a União Europeia a aplicá-los.?

"Vitória de Bolsonaro?

O acordo com a UE foi celebrado como uma vitória da política internacional do governo Jair Bolsonaro no ano passado. Depois de 20 anos de negociações entre os blocos, o acordo parece longe de chegar a um desfecho favorável. O termo foi firmado em 28 de junho de 2019 mas, para entrar em vigor, depende da ratificação de todos os países envolvidos.

A resistência é grande, principalmente devido aos problemas ambientais que fazem com que muitos produtos agropecuários produzidos na América do Sul cheguem à Europa com o selo de "desmatamento importado? ? ou seja, por terem sido cultivados de maneira não sustentável, a culpa ambiental também é vista como dos compradores. A chanceler federal alemã, Angela Merkel, por exemplo, já demonstrou "sérias dúvidas? sobre a viabilidade do acordo.

Histórico do Acordo

Quando foi firmado, em 2019, o tratado entre os dois blocos foi celebrado como um feito histórico. A soma dos mercados representa 25% da economia do planeta ? e afeta diretamente 780 milhões de pessoas. Na época, o governo brasileiro divulgou uma estimativa de que o acordo, uma vez em vigor, traria um aumento de R$ 336 bilhões em 15 anos ao PIB do Brasil.

No mês seguinte, entretanto, sobretudo pela repercussão internacional das queimadas recordes na região amazônica ? foram 30.901 focos somente em agosto de 2019 ?, líderes europeus passaram a utilizar a questão ambiental para, publicamente, externarem animosidades frente à ratificação do tratado.

Para o jurista Chris O?Connell, da Universidade da Cidade de Dublin, artigos acadêmicos como o produzido por eles servem para fornecer aos "Estados, organizações e cidadãos os meios para olhar para o que realmente está em jogo?. Ele destacou pontos como a emergência climática, "os incêndios galopantes na Amazônia? e as taxas crescentes de desmatamento no Brasil como alertas que precisam ser observados pelo resto do globo.

"Esperamos que eles acolham nossa análise com sensibilidade, entendendo a urgência e a gravidade do momento. Que compreendam que estão prestes a ratificar um acordo comercial que não tem os mecanismos necessários e suficientes para garantir que as políticas públicas europeias de crescimento verde sejam atendidas?, argumenta Reis.

Pesquisadora das universidades de Oxford e de Lancaster, a bióloga e ecóloga Erika Berenguer preocupa-se com os efeitos que o tratado, da maneira como está redigido, pode trazer para a Amazônia.

Segundo ela, a expansão agropecuária na região "não foi boa para ninguém?, e a prova está no fato de ser um lugar com baixo índice de desenvolvimento humano "e maior taxa anual de perda de floresta?. Ela acredita que o momento é de buscar por alternativas que tragam "novas formas de desenvolvimento para a região, que não venham atreladas ao desmatamento?.

Com informações da Deutsche Welle Brasil



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