Governo e indígenas divergem sobre medidas de proteção durante a pandemia
por: Nathalia Bignon
Autoridades federais e representantes de povos indígenas discordam sobre o número de índios infectados no Brasil pela Covid-19 e sobre as medidas adotadas pelo governo para garantir o isolamento desses povos. Enquanto órgãos oficiais dizem que estão mantendo barreiras sanitárias para evitar o contágio nas aldeias, índios seguem denunciando invasões de seus territórios por garimpeiros e madeireiros, o que aumenta o risco de entrada do novo coronavírus nessas áreas.
Segundo a Secretaria Especial de Saúde Indígena do Ministério da Saúde (Sesai), até o dia 3 de setembro, quase 24 mil índios haviam sido infectados e 392 morreram. Os números estão em constante atualização.
Já o levantamento da Articulação dos Povos Indígenas (Apib) ? entidade da sociedade civil ?, aponta quase 30 mil infectados e 779 mortes na mesma data.
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O secretário de Saúde Indígena, Robson Santos Silva, afirma que a divergência ocorre porque a Sesai trabalha com números que atingem os índios que moram em aldeias, não em cidades. Para estes, o atendimento ocorre pelo SUS, como o de qualquer outro morador de área urbana, e os números entram na estatística geral, apurada em cada cidade.
Decisão do STF
Por decisão tomada no início de julho pelo ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Luís Roberto Barroso, em ação movida por partidos de oposição, a Sesai passou a ter que atender também os índios que moram em áreas urbanas, o que, segundo Silva, desorganiza a qualidade do atendimento.
"A Sesai atende a mais de 6.200 aldeias e o público-alvo da Sesai são os indígenas aldeados. É claro que não se nega que uma pessoa nasce e morre indígena?, afirma. Ele ressalta que todos os brasileiros são atendidos pelo SUS. "Nesse contexto, aquela população que não estiver dentro das aldeias, cabe a cada um dos demais entes da tripartite do SUS, ou seja, municípios e estados.?
O secretário de Saúde Indígena afirma ainda que, entre as medidas tomadas pelo órgão, está a instalação de unidades primárias para enfrentamento à Covid-19 nas terras indígenas, com atenção de média e alta complexidade.
Em julho, durante uma audiência pública na comissão externa da Câmara dos Deputados que analisa o combate à Covid-19, também houve desencontro nos dados sobre a contaminação entre os índios.
Indígenas isolados
Segundo a Fundação Nacional do Índio (Funai), existem 217 barreiras sanitárias para as terras indígenas, com a suspensão de autorizações para entrada nesses territórios. Mas a advogada do Instituto Socioambiental, Juliana de Paula Batista, ressalta que existem diferentes situações indígenas, que demandam soluções igualmente diversificadas. Há os índios isolados e os de recente contato, que são mais suscetíveis a doenças.
"Seja por ausência e por dificuldade de acessar materiais de higiene e de limpeza, de acessar água potável, então essa vulnerabilidade precisa ser levada em consideração?, ressalta Batista. "E a gente também tem outro fator que é a presença de invasores em algumas áreas, o que torna muito preocupante a possibilidade de contato com essas comunidades de uma maior disseminação do novo coronavírus.?
Essa também é a preocupação da coordenadora da Frente Parlamentar Mista em Defesa dos Direitos dos Povos Indígenas, deputada Joenia Wapichana (Rede-RR).
"O ideal era que não entrasse o coronavírus nas aldeias, era preciso ter reforçadas as barreiras sanitárias, porque as próprias comunidades tomaram iniciativa. Era necessário estabelecer quais as vias de contaminação. E a gente sabe que as ilegalidades relacionadas à invasão de terras indígenas não cessaram, como a entrada de garimpeiros, de madeireiros?, enumera a deputada, cobrando o fortalecimento da fiscalização.
Sem médicos
Em julho, o secretário de Saúde Indígena já havia afirmado em audiência pública na comissão externa da Covid-19 que as vagas de médicos e enfermeiros na Sesai de Mato Grosso não eram ocupadas, apesar de o salário ser o dobro do pago a médicos e enfermeiros no estado.
Silva alega também que o avanço da doença em territórios indígenas teve uma trajetória própria. Começou na região Norte, no Alto Rio Negro e Alto Solimões, entrou no Vale do Javari e fez uma bifurcação entrando pelo Pará por um lado, e avançando no Centro-Oeste até Mato Grosso do Sul, onde os casos de Covid-19 vêm crescendo, além da Região Sul.
Segundo ele, o índice de letalidade entre os indígenas está em 2,1%."A gente vê muitas reportagens, muitos estudos que indicam um número diferenciado desse. Mas os nossos números se dão com base nos 14.200 profissionais que estão em campo?, afirma.
"A taxa [de letalidade] varia no tempo. De acordo com a região ela se acentua, mas baixa rapidamente. Então hoje, em termos gerais, em termos de média, nós estamos em 2,1%, esse é o número real?, garante.
Segundo o ministério da Saúde, no Brasil, a taxa está em 3,1%,. No mundo, segundo projeções da Organização Mundial da Saúde, está em 0,6%.
Estrutura
A Sesai afirma que vem trabalhando em 1.200 unidades básicas de saúde nos 34 distritos indígenas com 800 equipes multidisciplinares. Seis em cada dez profissionais da Sesai são indígenas, o que inclui agentes indígenas de saúde e de saneamento.
Já a Funai afirma que foram investidos R$ 24 milhões em ações preventivas. Mais de 280 mil cestas básicas foram entregues a indígenas e cerca de 48 mil kits higiene e limpeza.
Com informações da Agência Câmara de Notícias
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